Dia desses fui surpreendida com uma frase da Clarice.
- Mãe, eu quero aprender a ir pra escola sozinha…
Dei aquela arregalada de olho, respirei fundo, engoli seco. O coração acelerou. Deu até uma palpitação.
Pensei em dizer, “você está louca, você só tem 7 anos. Que loucura.” Ou então, “tá bom, quando você fizer dezoito anos você vai”. Mas com toda calma do mundo respondi:
- Então vamos começar a aprender, até o dia que puder fazer sozinha!
- Oba!
- O caminho você já sabe?
Ela toda confiante respondeu
- Sei. É só ir até ali, atravessar a rua, esperar abrir o farol, atravessar a avenida, descer a ruela e chegou.
- Isso. Mas agora vamos aos detalhes...
Pai e Filha andando por ai...Acervo pessoal |
Enquanto caminhávamos, fui explicando pra ela tim tim por tim tim de como as coisas funcionam. Fui mostrando tudo que ela precisava prestar atenção. As pessoas que passam ao lado dela. As que estão vindo atrás dela. Aquela que está láaa loonge, mas que precisa estar atenta também. Falei de como atravessar as ruas. De estar atenta aos carros que passam. Aos que param. Aos que aceleram.
Depois de tudo explicado e compreendido - assim espero - disse que ela poderia começar a treinar sem darmos as mãos, lado a lado. Ela prontamente concordou - O que me parte o coração, já que era a parte mais deliciosa do meu dia.
Ela logo se soltou e ficou ao meu lado.
Clarice está acostumada a andar nas ruas. Temos o hábito de caminhar pela cidade. Desde pequena ela foi ensinada sobre o que fazer e como fazer. Ela é bem esperta. Faz tudo direitinho.
Ao mesmo tempo que ela entende os pormenores do passeio, percebo que o olhar dela ao caminhar não é esse olhar “adulto”. Ela olha o formato dos troncos das árvores. A quantidade de folhas secas no chão. O vento que sopra quando passa um ônibus a toda velocidade. A distância entre um risco e outro da faixa de pedestres. Os desenhos nos muros. O barulho da ambulância. As buzinas dos carros no horário do rush. As cores das calçadas.
Espero muito que ela não perca esse olhar, mas também espero que ela esteja atenta aos percalços do seu caminho. Da vida.
É claro que ela não vai sozinha para escola. Eu a acompanharei. Sempre. Andando ao seu lado. E quem sabe, às vezes, consigo pegar um pouquinho a sua mão…
Texto: Maria Fernanda Garcia