terça-feira, 31 de agosto de 2021

Cresceu! Será?

 Dia desses fui surpreendida com uma frase da Clarice. 

- Mãe, eu quero aprender a ir pra escola sozinha…

Dei aquela arregalada de olho, respirei fundo, engoli  seco. O coração acelerou. Deu até uma palpitação.


Pensei em dizer, “você está louca, você só tem 7 anos. Que loucura.” Ou então, “tá bom, quando você fizer dezoito anos você vai”. Mas com toda calma do mundo respondi:


- Então vamos começar a aprender, até o dia que puder fazer sozinha! 

- Oba!

- O caminho você já sabe?

Ela toda confiante respondeu

- Sei. É só ir até ali, atravessar a rua, esperar abrir o farol, atravessar a avenida, descer a ruela e chegou.

- Isso. Mas agora vamos aos detalhes... 


Pai e Filha andando por ai...Acervo pessoal


Enquanto caminhávamos, fui explicando pra ela tim tim por tim tim de como as coisas funcionam. Fui mostrando tudo que ela precisava prestar atenção. As pessoas que passam ao lado dela. As que estão vindo atrás dela. Aquela que está láaa loonge, mas que precisa estar atenta também. Falei de como atravessar as ruas. De estar atenta aos carros que passam. Aos que param. Aos que aceleram.


Depois de tudo explicado e compreendido - assim espero - disse que ela poderia começar a treinar sem darmos as mãos, lado a lado. Ela prontamente concordou - O que me parte o coração, já que era a parte mais deliciosa do meu dia. 


Ela logo se soltou e ficou ao meu lado.


Clarice está acostumada a andar nas ruas. Temos o hábito de caminhar pela cidade. Desde pequena ela foi ensinada sobre o que fazer e como fazer. Ela é bem esperta. Faz tudo direitinho.


Ao mesmo tempo que ela entende os pormenores do passeio, percebo que o olhar dela ao caminhar não é esse olhar “adulto”. Ela olha o formato dos troncos das árvores. A quantidade de folhas secas no chão. O vento que sopra quando passa um ônibus a toda velocidade. A distância entre um risco e outro da faixa de pedestres. Os desenhos nos muros. O barulho da ambulância. As buzinas dos carros no horário do rush. As cores das calçadas. 


Espero muito que ela não perca esse olhar, mas também espero que ela esteja atenta aos percalços do seu caminho. Da vida.


É claro que ela não vai sozinha para escola. Eu a acompanharei. Sempre. Andando ao seu lado. E quem sabe, às vezes, consigo pegar um pouquinho a sua mão…


Texto: Maria Fernanda Garcia


terça-feira, 24 de agosto de 2021

O Tempo

"O tempo absoluto, verdadeiro e matemático, por si mesmo e por sua própria natureza, flui igualmente sem relação com nada de externo, e com outro nome, é chamado de duração", disse Isaac Newton. 

Outro dia me perguntaram se tinha saudades da minha filha quando bebê e se eu gostaria de voltar no tempo. Para quando ela era pequenina. A minha resposta surpreende, porque não quero voltar no tempo. Vivemos bem aquele tempo, que agora passou. Olho as fotos, e fico feliz dela ter sido a bebê linda que foi, mas não quero voltar lá. 

Depois que ela nasceu, eu queria muito que aquele início difícil passasse rápido. Não via a hora que os três meses chegassem - esse era o prazo que todo site materno e de mães experientes dizia que as coisas ficariam mais fáceis. Foram tempos difíceis e de entrega total para aquele serzinho que dependia de mim para viver. Dias intensos. Noites longas. Paciência - por muitas vezes - curta. 

Passado os três meses, ansiava por seis meses, até que parei de esperar e resolvi aproveitar aquele tempo. Pausei e comecei a viver o agora. Vivi e aproveitei intensamente todos os momentos.

Photo by Andrik Langfield on Unsplash

Curti o crescimento dela em todas as suas fases. As boas e as ruins. As noites mal dormidas, as carinhas fofas, o colo sem fim, o beijinho surpresa em mim, os primeiros passos, as primeiras palavras, o primeiro machucado sério - com direito a cinco pontos na testa, o primeiro dia de aula, enfim, todas as suas fases e suas primeiras vezes eu estava presente, ao seu lado, torcendo, vibrando e chorando (claro!). Fui testemunha do nosso tempo. Criamos um vínculo tão forte, de tanta cumplicidade, de tanto respeito que meus olhos brilham em ver seu crescimento. 

Alguns dizem que o tempo passa rápido. Mas essa noção de tempo é muito subjetiva. Essa sensação da passagem do tempo é totalmente reflexo do nosso mundo interno e do que estamos sentindo, que nos dá a sensação de ver o tempo voar ou se arrastar .

Tudo está relacionado a emoção, a memória e alguns neurotransmissores. "O tempo do relógio é o tempo cronológico, do social, do coletivo, que segue uma linearidade temporal marcada pelos segundos, minutos e horas. Já a experiência pessoal do tempo é elástica e diversos fatores podem influenciar e interagir nela" diz Raquel Cocenas.

Uma boa dica para desacelerar os dias é apreciar as coisas simples. Prestar atenção nas pequenas coisas do cotidiano. Nas pessoas, nas ruas, nas cores, nos cheiros, nos sabores.

Não quero voltar no tempo. Gosto da minha filha assim, do jeitinho que ela está agora. Grande, com 7 anos e 45 dias. Ontem gostei muito dela com 7 anos e 44 dias. E assim seguimos, dia a dia. Vivendo bem o dia presente. Hoje. Sem pressa. No nosso tempo. 

Texto: Maria Fernanda Garcia

terça-feira, 17 de agosto de 2021

Não depende de nós


"Das coisas existentes, algumas são encargos nossos; outras não. São encargos nossos o juízo, o impulso, o desejo, a repulsa - em suma: tudo quanto seja ação nossa. Não são encargos nossos o corpo, as posses, a reputação, os cargos públicos - em suma: tudo quanto não seja ação nossa.” (Epicteto 50 - 135 d.c)

Sexta feira passada foi dia de “jantar filosófico” em casa. Calma. Não somos filósofos não, mas usamos a máxima de Epicteto essa semana.


Photo by Fathul Abrar on Unsplash

Clarice estava extremamente chateada. Arrasada mesmo. Durante o jantar ela nos contou que no recreio as professoras fizeram um jogo entre duas turmas e no final, o grupo dela perdeu. Mas não foi isso que a deixou chateada, o que deixou ela arrasada foi um menino do grupo vencedor cantando e dizendo: “vocês são perdedores, vocês são perdedores…”

Durante o jantar ela dizia que ele não podia fazer aquilo porque ela não faria aquilo.

Foi nesse momento que fomos iluminados pelo estoicismo que diz que para se ter a felicidade e a liberdade é preciso entender que  algumas coisas estão sob nosso controle e outras não. E que está totalmente fora do nosso controle saber e dizer como os outros devem agir e de como somos vistos pelos outros.  Essas coisas não dependem de nós. E que tentar controlar ou mudar o que não podemos, só ficaremos mais aflitos, angustiados e arrasados. 

Diante disso ela perguntou: 

    - Mas então o que eu faço? Eu fico muito nervosa e brava!!!

Juntos fomos fazendo listas do que ela poderia ou não fazer e a conclusão dela… sim ela, do alto dos seus 7 anos de idade concluiu sozinha que o melhor seria ignorar, deixar pra lá, entrar por uma orelha e sair pela outra, let it go… 

Não que seja fácil! Eu com 39 anos às vezes ainda me pego pensando naquilo que não me diz respeito ao invés de manter a atenção concentrada em mim e no que de fato é meu. 

Mas seguimos no mantra - O que pertence ao outro é problema dele! O que pertence ao outro é problema dele!

Texto: Maria Fernanda Garcia


Fusca Azul


Você conhece a lenda do Fusca Azul?

Aquela brincadeira em que quem avistar um desses carros pelas ruas, enchemos o ser humano que está ao nosso lado de tapas.

Dizem que, no início do século 20, os veículos saíam da fábrica apenas na cor preta. Mas por um descuido de um dos operários - que errou na proporção da mistura das tintas - os carros começaram a sair da linha de produção num tom de azul. O dono da marca não gostou nada do erro e começou a dar tapas nas costas do responsável. Assim, esses carros “errados” passaram a ser vendidos apenas para funcionários, que começaram a dar os mesmos tapas nos outros quando viam algum.

Essa brincadeira é muito praticada pela minha família há tempos, atravessando gerações. Começou com meus avós, que passou para meus pais, e que passou para eu e meus irmãos, que passamos para nossos primos e que agora, Clarice, brinca como se não houvesse amanhã. Ela vive investigando como e com quem fazíamos essa, e outras brincadeiras, brinquedos, cantigas. Um resgate da cultura e do imaginário popular de outrora. 

Miniatura de Fusca Azul - Imagem: Consulado do Brinquedo


Teve uma época que tinha um fusca azul estacionado dentro da garagem do meu prédio. Algum morador desavisado - ou não -  comprou um exemplar do tal carro. A gente já entrava na garagem com a mão armada para bater no coleguinha do lado. Uma loucura.

Na garagem de uma das casas, perto do nosso restaurante japonês favorito, tem um fusca azul claro lindo. Nem preciso dizer que passamos por lá preparados para desferir tapas.

Dia desses, enquanto íamos para escola, eu tomei um tapa da Clarice acompanhado do grito “fusca azul”, e eu , desligada que sou, não achei o carro na rua. Então ela disse: “Ali”, apontando para uma miniatura do carro na banca de jornal - “mini fusca azul” ela disse.

E assim evoluímos a brincadeira que atravessa os séculos.


Texto : Maria Fernanda Garcia


Alívio

 

Domingo é dia de Avenida Paulista bebê!
Saímos com toda a nossa família para um passeio dominical delicioso. Isso era um hábito antes da pandemia. A gente costumava fazer esse tipo de coisa. O marido e a filha foram de bicicleta  e eu fui a pé com a cachorra. O dia estava lindo. Céu azul. Um calorzinho que tentava firmar diante de sucessivos dias frios. As ruas estavam cheias de pessoas como nós. Em busca de sol, atividade, movimento e vida.
Durante a caminhada eu senti. Senti demais. Começou com felicidade, passando logo para a raiva, a aflição, a angústia, o medo. Eram muitos sentimentos que se misturavam e que ia cada vez mais me atordoando e me deixando desconfortável. 
Eu sentia dor. Uma dor física no quadril. Como se tivesse uma agulha fincada entre o fêmur e o quadril. Normalmente essa dor passa conforme o exercício ocorre e o corpo aquece. Faz alguns meses que não passa. Que a dor é constante. Como se viver doesse. E doí. Viver dói. Crescer dói.

Junto com a dor física, tinha uma dor interna. Sem identificação. Mergulhei fundo em mim, mas a causa da dor não foi achada. A raiz da dor estava profunda. Tão profunda que faltou ar para mergulhar até lá. 
Uma dor sem nome.  E o que é difícil não saber nomear o que se sente. Só se sente. Só sabemos que dói. Dói no coração. Dói na alma. 
Esse “não conseguir nomear”, vem acompanhado de lágrimas que escorrem gordas pelo rosto. Onde a água que se bebe desce quadrada. O pedaço de bolo de chocolate desce amargo. O almoço bem caprichado deixa de ter graça. 
Foram horas desses mergulhos. E o ar ainda faltava. A boca seguia seca. A alma em frangalhos. Continuei. Mergulhando em mim mesma. Em busca de alívio.
O alívio da dor chegou junto com a palavra dita. Dita em voz alta para eu mesma ouvir. Dita em voz alta para meu marido. Dita em voz alta para minhas vizinhas (que nunca conversei…) ouvirem. E foi aí. Depois de dizer, de verbalizar, que eu consegui pegar o ar que faltava para conseguir chegar lá, no meu eu profundo. Achei. Alívio. E que alívio.
Que não nos falte clareza para identificar o que sentimos, palavras para dizermos o que aflige e ar para chegar lá, bem no fundo e voltar a viver de maneira mais plena, consciente e tranquila possível. Perfeita não, Possível!

Texto: Maria Fernanda Garcia

quarta-feira, 11 de agosto de 2021

Horta

Provavelmente você deve gostar de ter contato com a natureza. Talvez você, assim como eu, virou mãe ou pai de planta durante a pandemia. 


Já tive uma horta na minha casa antiga. Tínhamos uma pequena varanda com as condições perfeitas para cultivar. Sol, Luz e Água na medida. Lá tinha plantado tomates, couve, alface, rúcula e temperinhos como manjericão, alecrim, cebolinha, orégano e hortelã. Era uma delícia cuidar da nossa horta. 


Esse contato com a natureza, com a terra e com as plantas me emociona. O cheiro da terra molhada. O cheiro do verde.  É delicioso. É sensorial. É meditativo. Mexe com as emoções. Sem falar no ato de comer o que se planta. Perco noção do tempo quando estou ali, com as plantas. É encantador.


Mudamos de casa e levei minha horta. Ela não sobreviveu à mudança de local. Já que não tem a mesma intensidade de sol e luz natural por aqui. Insisti, confesso que não com muito afinco - algumas vezes, e me rendi as plantas ornamentais que precisam de menos pra viver. 


Photo by Marina Helena Muller on Unsplash


Dessa vez estou decidida a fazer acontecer. É a vigésima tentativa. São temperos. Alguns estão lindos e enormes. Outros passaram por poucas e boas e continuam fortes. E tem aqueles que seguem tentando viver - já mudei eles de lugar, adubei e estou cuidando


As plantas nos mostram que a vida é cheia de  ciclos. Ora você é um brotinho tentando vencer e lutando para viver e ora você já é planta grande autônoma e cheia de si. Elas sempre dão um jeito de sobreviver as mais diversas situações. Há muitos perrengues. Elas se reinventam o tempo todo e conseguem seguir adiante. Mesmo com as adversidades.

 
Aprendo tanto com elas. Eu, assim como as plantas, estou me reinventando. Elas estão em busca de sol, água, nutrientes e vida. E eu em busca do meu lugar ao sol, do meu autoconhecimento, da minha inteligência emocional e do meu propósito de vida. 


Texto: Maria Fernanda Garcia

Lentes

Com uma cara emburrada de ter sido acordada cedo e um olhar mau humorado e de poucos amigos, ela se dirigiu até a mesa da cozinha para tomar seu café da manhã. No prato de louça branco tinha uma fatia do seu melão favorito já cortadinho. Pronto para ser consumido. Na sua frente estava um pote de vidro com o restante do bolo de chocolate. Sobras de seu aniversário. E pra acompanhar, um copo de água bem fresquinho. Do jeito que ela gosta.


Sentei-me ao seu lado, com meu prato de louça branco e a minha fatia de mamão habitual, minha xícara preferida, grande, de bolinhas, com café preto recém passado, um vidrinho com iogurte natural caseiro, o pote de mel e o pote de granola.


Seguimos em silêncio enquanto apreciamos nossas frutas. Nosso bolo. Nosso iogurte. Nosso Café. Nosso momento. 


Ela, sempre tão faladeira, estava quieta.


Várias vezes pensei em quebrar o silêncio com alguma tirada engraçada, mas respeitei. Entendia seu silêncio. Afinal já tinha passado por isso em vários momentos da minha vida. Em todos os retornos das férias. 


No dia anterior ela estava indignadíssima, inconformada, chateadíssima e se achando super injustiçada por ter apenas 30 dias de férias. 


- Somente um mês de descanso mamãe, e o resto do ano é de trabalho - ela dizia.  Não é justo! 


Assim como em todos os domingos ela diz não ser justo somente dois dias de descanso contra cinco de trabalho.


- Também acho! Muito injusto! - respondi


Quebrei o silêncio congelante do café da manhã e começamos a conversar. Perguntei a ela  o que mais gostava das férias e dos  finais de semana. 


- Brincar! Só brincar!


Disse que ela podia levar a vida mais leve durante a semana.  Ela só precisava trocar o tipo de lente que ela via as coisas e o mundo. Os dias de semana também podem ser legais como os finais de semana. Regados a brincadeiras, já que na escola ela passaria os dias mais interessantes de sua vida. Com amigos. Parceiros. Cúmplices. 


Terminamos o café da manhã um pouco mais animados.  Escovamos os dentes, arrumamos as camas, trocamos de roupa. E voltamos ao ritmo normal.


E quem estava mais animada do que nunca quando chegou na escola? Ela! 


Falei. Foi só trocar a lente.


Texto: Maria Fernanda Garcia

O que você faz quando não tem nada pra fazer?

 O que você faz quando não tem nada pra fazer?


Quando eu digo nada, é nada mesmo. Sem celular, sem livros, sem revista, sem séries e filmes, sem nenhum entretenimento externo. Com todas as suas necessidades básicas cumpridas, ou seja, você está hidratado, alimentado, suas demandas de trabalhos e da casa feitos, atividade física ok e filhos bem cuidados e entregues a terceiros. Enfim, sem pendências nenhuma. Somente você com você mesmo e seus pensamentos. 


Me peguei assim num dia desses.


No início fiquei incomodada. Os pés não paravam de mexer. Me acomodava e re-acomodava na poltrona. Até que me entreguei as profundezas dos meus pensamentos. 


Não fiquei ansiosa, pois não foram pensamentos sobre o passado e nem sobre o futuro, foram mergulhos nas sensações do momento presente. Como os cheiros, sons e vistas incríveis. Uma meditação no meu ser. Auto observação e conhecimentos vividos na íntegra e sem interrupções.


Photo by Anna Scarfiello on Unsplash

A gente e o nosso cérebro precisa vez ou outra desse tempo de relaxamento e de ócio para organizar as informações vividas, aprendidas e mais que isso, precisamos desse tempo para nos conectarmos com nós mesmos e com a natureza de nós. 


Quando encontramos nosso eu, fica difícil de traduzir o sentimento. A gente só sente. A gente se coloca diante da vida e contempla o nosso ócio, o “nada pra fazer”.


Texto: Maria Fernanda Garcia


Você Sonha?

 

Você sonha enquanto dorme? Que tipo de sonho você sonha? Seus sonhos são um retrato da sua realidade? 


Eu consigo explicar melhor com um exemplo…Faz de conta que você sonhou que foi até a padaria. Sonho um: você saindo do seu apartamento, pegando o seu elevador, cumprimentando o porteiro e indo até a padaria que de fato existe e depois voltando para a casa normalmente. Sonho dois: você pensando em ir até a padaria, aí você abre a porta do banheiro e lá é a padaria, que para você pegar pão, tem que descer seis andares num cano de bombeiro e pra voltar, você voa até a sua casa novamente, mas não é um voo a lá super homem, é um voo como se estivesse nadando peito no ar. 


Eu sou do time “sonho dois”, aliás, esse sonho foi meu! Não me pergunte o porquê, mas meus sonhos são sempre assim meio doidos, totalmente irreais, míticos, simbólicos, malucos. Minha terapeuta sempre pede pra saber dos meus sonhos e analisa-os de acordo com o que estou vivendo e ela sempre acha um sentido neles, mesmo sendo assim, estranhos. 


Photo by Ella Jardim on Unsplash

Para Freud, o pai da psicanálise, o sonho seria um ótimo material para entender seus desejos, e resolver questões. E de fato pra mim é assim mesmo. Quando estou levando a vida no piloto automático, sem atenção para dentro, as respostas das minhas questões sempre aparecem em sonhos. É impressionante! 


Você também sonha? São sonhos tal qual os meus?


Uma coisa é certa, não há limite para quem sonha. Outro dia sonhei que uma amiga minha era uma mendiga. O que isso quis dizer? Não sei. Só sei que era a cara dela, era ela certeza.


Texto: Maria Fernanda Garcia

Férias de inverno

 

Começaram as férias escolares da Clarice! Serão 31 dias de pura diversão. 


Tem uma coisinha que me deixa um pouco apreensiva com essas férias. O frio! E esfriou muito por aqui.


Fiquei pensando nas minhas outras férias de inverno, quando ainda não tinha filho. A gente buscava o frio. Éramos caçadores de frio. Íamos viajar para a serra e o ápice era se estivesse fazendo muito frio. Comer um Fondue, beber vinho em volta da lareira, passear bem tarde só pra sentir mais o ar gelado, sentar nas varandas dos restaurantes com calefação e observar o movimento. Eram coisas deliciosas de se fazer.


Faz sete anos desde que a minha filha nasceu, que estamos fugindo do frio. Todas as férias de inverno dela, passamos em lugares quentes, com praia, piscina e tudo que um bom calor pede.

Ultimamente o sonho da vida dela é conhecer a neve e passar muito frio.


Photo by Fabio Traina on Unsplash

Na última semana de aula fui levá-la pra escola a pé, e estava congelando, garoando, fazia 8° com sensação térmica de 5°. Eu estava sofrendo e ela estava amando. Inclusive chegou a dizer ter sido o melhor dia de sua vida.


As férias começaram agorinha e já temos mais um “sonho da vida” quase cumprido, só faltou a neve.


Texto: Maria Fernanda Garcia


Novela mexicana, capítulo 2


Estamos de volta com a programação da nossa novela mexicana favorita. O personagem deste capítulo é Cássio Rogério. 


Photo by Roberto Carlos Roman Don on Unsplash

Semana passada meu marido travou o pescoço. Na verdade ele não soube bem me dizer onde de fato estava doendo. Era na região entre o pescoço e o cóccix - quando ele falou cóccix na verdade disse aquela outra palavra que começa com C, mas voltemos ao cóccix.


Cheguei no quarto e ele estava sentado meio deitado na cama, ereto e branco. Perguntei o que estava acontecendo e ele respondeu com a respiração pausada. Travei. As. Costas. Não. Consigo. Me . Mexer. Nem. Respirar. Profundamente.


Falei pra ele se ele já tinha tomado remédio, e ele disse não ter achado, nem a caixa enorme de remédios escrita “Remédios” que fica no mesmo lugar há uns 11 anos  e nem o remédio dentro - não sei o que acontece com homem que enxerga mas não vê, impressionante. 


Peguei os comprimidos que ele queria tomar, levei água, esquentei a bolsa de água quente, ajudei ele a trocar a roupa, a deitar na cama, ajeitar os travesseiros e se cobrir.


Ele conseguiu relaxar e dormir. 


No dia seguinte, durante o café da manhã, perguntei se ele estava melhor e ele disse estar 90% melhor.

 

Tentamos juntos entender o que tinha acontecido e ficamos em dúvida se foi um infarto, pedra nos rins, coronavírus, hérnia de disco, apendicite, torcicolo ou uma unha encravada mesmo.


Texto: Maria Fernanda Garcia


Solitude

Depois de quase 1 ano e meio eu pude  ficar sozinha em casa!

Foi uma tarde inteirinha sozinha. 5 horas. 300 minutos. Somente eu comigo mesma. 


A.P (antes da pandemia) eu ficava sozinha em alguns dias da semana e amava. Era nesses momentos que eu me conectava comigo. Que eu fazia o que eu queria ou que simplesmente não fazia nada e não tinha ninguém em casa para ver isso. Era somente EU. 


D.P (durante a pandemia) eu também faço tudo que quero, incluindo não fazer nada, mas tem sempre alguém em casa para ver. 


Photo by Toni Reed on Unsplash

Meu marido saiu de manhã para uma reunião presencial no escritório e eu e minha filha ficamos a manhã todinha juntas. Só que o período matutino passa num piscar de olhos. Quando menos percebi já estávamos saindo de casa rumo ao Colégio. 


Chegando na porta da escola, me despedi dela e instantaneamente um sorriso começou a surgir no meu rosto. Minha vontade era dar uma “sambadinha” de felicidade ali mesmo. Mas me contive. Passei na padaria e fui para minha casa, curtir meu momento. 


Abri a porta e me vi ali. Diante da sala. Vazia. Me esperando. Corri e dei uma cambalhota no tapete, tamanha era a minha empolgação. Dei corridinhas pela casa, dancei, rebolei, pulei e parei.


Fiquei sozinha! Sozinha não! Em minha companhia. A tarde toda. Me curtindo. Me amando. Falando sozinha. Não fazendo nada. No silêncio. No ócio. Na solitude. Mas não foi uma solitude doída não. 


Foi uma solitude que me abraçou, uma solitude que me fez respirar, me acalmar, me cuidar, silenciar.


Um silêncio maduro. Um silêncio que transforma. Um silêncio cheio. Um silêncio gostoso.


Hoje em dia consigo me silenciar mesmo no caos da minha casa sempre cheia. Mas que é bom ficar só, ah isso é! 


Texto: Maria Fernanda Garcia


A queda


Você já caiu na rua? Caiu, espatifou-se, tomou um rola?


Eu já caí algumas vezes e não sei dizer o que é pior. Se é a dor da queda ou a dor moral por ter feito algo muito embaraçoso.


Acervo Pessoal do Instagram

Vou contar três dessas quedas. Uma em cada época da minha vida. Tiveram mais? Claro! Mas não vou me humilhar tanto assim...


Eu ainda era adolescente dos anos 90. Morava num bairro bem residencial de casas. Estava voltando do inglês que ficava duas ruas acima, e conforme eu descia a ruela do meu quarteirão eu vi uma folha de revista no chão, e o que a adolescente besta fez? Pisou na folha. E no mesmo instante a folha deslizou rapidamente na rua e eu caí! De perna aberta. No melhor estilo espacate de ser. Meu cabelo voou pra cima! Foi uma queda rápida. Ao mesmo tempo que cai,  já levantei pra ver se alguém tinha visto. Ainda bem que não existia

celular naquela época, senão já estaria famosa na internet. 


Outra queda que não consigo esquecer foi quando eu já era uma jovem mulher e já dirigia. Parei meu carro num estacionamento para ir a um compromisso e na volta, estava esperando o manobrista trazer meu carro até a porta para poder ir embora. Assim que ele chegou, desceu do carro e segurou a porta para eu poder entrar. Nesse exato momento eu escorreguei. Uma perna foi parar embaixo do carro e a outra continuou de pé. Mas o pior foi o manobrista me segurando pelo SUVACO. Como se segura uma criança. Nos dois suvacos. E detalhe. Fazia um calor, eu estava de regata. Ele pegou no meu suvaco direto. Pele com pele. Fiquei constrangidíssima. Agradeci a ajuda, entrei no carro e saí voando dali. Será que ele lavou a mão depois disso?


E a minha última gota de dignidade foi perdida a semana passada. Parei meu carro no estacionamento do supermercado (o único lugar que vou durante a pandemia).


Pois bem.


Estava andando dentro do estacionamento e sabe aquelas “tartarugas” de trânsito que separa as faixas duplas? então. Eu calculei errado o tamanho dela e dei uma trupicada. Mas não foi uma simples trupicada. Eu perdi o equilíbrio e comecei a “catar cavaco” por uns 10 metros. Só parei agarrada na blusa de um senhor que me olhou com uma cara de espanto. Não sei se pela força com que me segurei nele ou se pelo fato de ter encostado em alguém durante o COVID. Fiquei extremamente envergonhada. Tinha mais gente no lugar, todo mundo me olhando. Alguns rindo e eu só consegui dizer:


OPA!

E você? Já caiu na rua? Já pagou mico? Já comeu areia, barro, concreto? Conta aí. Não me deixe passar vergonha sozinha.


Texto: Maria Fernanda Garcia